segunda-feira, 16 de janeiro de 2006

Do projeto literário "Das imperfeições" (1999)

Das Imperfeições


eu
precisava
chorar.

tu
precisavas
chorar.

tu
me consolavas,
menina.

eu
tinha
esse jeito
tosco
de quem
não gosta
de nada.

me
ensinaste
a
simplicidade.

eu
precisava
chorar.

[...]


sorriu
por ter lhe
confiado
meus escritos
do fundo
do poço.


e,
lembrei
de minha
mãe de
novo.

estas
festas de fim-de-ano
trazem à
tona
tanta coisa estranha...

[...]


este tom grave
de minhas palavras
deixaram
boquiabertas
as
meninas ingênuas.
e, retive, eventos
que me pareciam
estranhas
imagens.
desconhecia
minha serenidade
e a bondade.

passei estes anos
descobrindo
coisas perigosas...
perigosas demais
para quem
acredita
ter a chave
do universo.

ontem,
podia ter chovido.
hoje
também.

tenho dormido
tarde.
lido os livros
de caio fernando abreu
e escutado músicas
do sul.

a combinação literária
das raízes
com as músicas
nativas, remetem-me
ao ar
dos campos,
ao cheiro
de bosta
de cavalo,
ao meu avô ermelino.
sinto saudades
desta plenitude
da infância, que
já se desbotou
com o tempo.

perdi
minha pureza
e tenho medo
do que posso
me transformar.

é por
isso que converso
com o mano.
ele me diz que
faz o jogo
do sistema para poder
sobreviver.
e eu
também.

na verdade
queremos
sempre ter um
bom pretexto
para conversarmos
sobre
o
que nos incomoda.

o mano compra
muitos livros.
a estante
suporta
o universo literário
em que me
prendo
e ainda não compreendo.

antes,
imaginava
que a
literatura
era mera erudição,
apenas uma
maneira de
não ser
tapado.
pura
tolice.

e se escrevemos,
é porque
não temos
outra arma
senão a nossa
língua,
a palavra,
o verbo,
o falo...

falamos
de
nossas gurias
com aquele entusiasmo
de homens
que amam.
não é mero exercício
de virilidade.

[...]

sei
que temos e
teremos
a
habilidade
para nos
afastarmos
de pessoas
inconvenientes.

sempre
tem
aquele(a)
que te
aborrece com
memórias
de tempos
idos e (mal) vividos,
com o sorriso
da
maldade
no
canto dos
lábios.

prefiro ler
os livros
da estante.

acompanha-me
o chimarrão
nas horas
em que varo
a madrugada.
são nestes instantes
em que
mais crio.

vejo
fragmentos
de gente
nas ruas.
ninguém tem
prazer.
o corpo da menina
inda adolescente
é muito
jovem para
iscas sacanas.

por todos
os lados
os mais
imbecis
outdoors...
vendem tudo:
amor, sexo, violência,
informação, conhecimento,
políticos, sabonetes,
preservativos,
clínicas médicas,
etc. etc. etc.

“do que tens medo?” –
ela me pergunta.
“sou um bicho
esquisito” –
respondo.
e,
acaricio
as suas coxas,
e a flor
molhada orvalha
os meus dedos
saltitantes.

tenho medo
de muitas coisas.
mano me diz
que escrever
é um ato
de coragem.
só isso
é o bastante.

gosto
de tomar banho
antes de dormir.
é uma
sensação
de pureza
muito particular.

devo encerrar a
desdita
de minhas imperfeições
obscuras.
quero beijar
a
face
de meu único
amigo.
amigo que encontrou
o
caminho mais
nobre,
mas o mais tortuoso.

talvez, as víboras
avancem
para devorar
os últimos trocados.
são assim:
roem
as beiras,
os miolos do
pão, para depois,
se atrancarem
ao filé com
uma voracidade
devastadora (somente
vísceras saltadas
pelo chão).

sou tão
imperfeito
para compreender
o que
é essencial
em
tudo.

[...]

o blá-blá-blá
de
tantos eruditos,
quase me
enlouquece.
pensam
muito.

sentem
pouco.

e ela
me conta
que
a
carência faz coisas.
e eu sei
bem do
que ela
fala.
ano passado, nesta
mesma época,
estava em casa alheia,
sofrendo
em silêncio,
maldizendo
a minha
tão idiota
aventura.

ser imperfeito.
ser plural.
que agonia
carrego no peito?
nada mais te conforta (?)

recolhe esta
mágoa...
inda tenho
esperança (?)
não rias da minha
inocência...sou
como tu,
imperfeito feito aço e flor e espinho e cansaço.

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