Como bem apontou a
jornalista Andrea Dip em sua investigação sobre a ascensão das religiões
neopentecostais no Brasil, o binômio política/religião se tornou uma mistura
explosiva num país em que quem tem definido as regras do jogo político são as
bancadas da Bíblia, do Agronegócio e das Armas no Congresso Nacional.
Mas não basta
tomar o poder. “A direita orgulhosa, religiosa e conservadora homenageia
torturadores em carros de som nas grandes avenidas”. Orgulham-se, portanto, de
sua ignorância; polemizam e provocam especialmente partidários e simpatizantes
da esquerda. Representam a maioria agora. Não têm medo de serem punidos. Estão
do lado das ‘pessoas de bem’.
A Frente
Parlamentar Evangélica (FPE) no Congresso Nacional é gigantesca, congregando
diversos partidos, inclusive parlamentares de partidos de esquerda. A Comissão
Pró-Política de Santa Catarina, estado que abraçou o capitão reformado do
exército com uma expressiva votação em 2018, por seu turno, representa “um
departamento da Convenção das Igrejas Evangélicas Assembleia de Deus de Santa
Catarina e Sudoeste do Paraná, cuja missão é conscientizar os fiéis sobre a
importância de votar em representantes dos interesses da Igreja (...). a
comissão se orgulha de ter ajudado a eleger 110 vereadores, 5 prefeitos e 4
vice-prefeitos ligados a ela nos últimos pleitos”.
Os temas de cunho
moral são os que unificam os parlamentares evangélicos, independentemente de
partido. Como são avessos aos argumentos, às evidências, à ciência
sistematizada, são “barulhentos, intempestivos, aguerridos, beligerantes, e
esse barulho cria a impressão de volume, de quantidade de poder, de coesão.
(...). é uma estratégia de parecer maior do que é, pelo grito – como acontece
nas próprias igrejas. As Igrejas têm esse discurso de guerra, de combate”. Mas
as alianças dos evangélicos com o capital também é evidente. Não por acaso a
bancada BBB (Bíblia/Bala/Boi) vota em bloco em qualquer situação!
Até determinados
pastores, acima de qualquer suspeita, denunciam de que as novas instituições
neopentecostais estão repletas de gângsteres religiosos, afeitos à lavagem de
dinheiro, sonegação de impostos e outras improbidades. Didaticamente,
importante se dizer, de acordo com os estudos do sociólogo Paul Freston e
trazido à baila por Andrea Dip, de “que a diferença mais importante entre as
Igrejas Históricas e as Pentecostais é a crença nos dons do Espírito Santo”. As
igrejas pentecostais estariam mais próximas da cultura do espetáculo e seriam
menos litúrgicas; no que tange às igrejas neopentecostais, como a IURD,
Renascer em Cristo, Bola de Neve, etc., as mesmas representam a “terceira onda
do evangelismo”, com ênfase na guerra contra o diabo e seus representantes na
Terra, além de difundirem a Teologia da
Prosperidade e o abandono dos tradicionais usos e costumes puritanos da
santidade, conforme análise do sociólogo, Ricardo Mariano. Em outras palavras,
a Teologia da Prosperidade é uma
reatualização dos estudos weberianos, conhecida por seus “apelos financeiros como
forma de garantir um espaço no céu”. Neopentencostalismo e o espírito do
capitalismo se convergem, nessa direção!
Tais igrejas detêm
1/3 das concessões de televisão no Brasil. Uma verdadeira farra de concessões
sem qualquer regularização e a desejada e ampla discussão com a sociedade
brasileira. Assim, foram angariando simpatizantes nas periferias, historicamente
esquecidas pelo poder público, que segundo o filósofo e psicanalista, Guilherme
Boulos, desencadeou uma verdadeira “captura subjetiva, mais do que a difusão de
uma ideologia. Tem a ver também com o empreendedorismo e com o esvaziamento de
soluções coletivas. O crescimento das Neopentecostais junto com o
empreendedorismo e com o enfraquecimento dos movimentos sociais, produz esse
caldo de uma ‘direitização’, mas isso não é simples, não dá para julgar o
pensamento dos evangélicos pelo pensamento dos pastores e líderes das Igrejas”.
Tanto é verdade que nem todo evangélico votou no capitão reformado do exército,
embora os mais de 20 milhões de votos necessários à Haddad no segundo turno do
certame eleitoral de 2018 estivessem concentrados nestes guetos neopentecostais
espalhados por todo o país.
Tragicamente, os
neopentecostais tornaram-se “personagens de um processo sem precedentes no
país, com plataformas baseadas na retórica do terror (‘querem acabar com a
família’), pelo impedimento da garantia de direitos sexuais e reprodutivos e
das ações de superação da violência de gênero. O que se desenha, como vemos,
pouco ou nada tem a ver com a defesa das famílias. Acaba por ser uma armadilha
(instrumentalização) de grupos políticos para quem professa uma fé”. Há mais de
1.500 denominações evangélicas no Brasil. Para a pesquisadora Christina Vital o
plano das lideranças dessas Igrejas é ocupar cargos executivos e o Judiciário,
para barrar as pautas relacionadas aos direitos reprodutivos das mulheres e à
comunidade LGBTQ.
Se a canalhice
foi, efetivamente, santificada, de acordo com as palavras da jornalista Andrea
Dip, que a mesma seja desvelada, desmascarada e totalmente destruída. Tal onda
reacionária está aniquilando os parâmetros civilizatórios que esse país
construiu a duras penas, mas que até hoje não pôde se consolidar pela
intervenção das elites dirigentes e agora apoiada por estas máfias religiosas
sedentas de poder e glória!