segunda-feira, 23 de março de 2015

A QUEM INTERESSA DESQUALIFICAR O MAGISTÉRIO?




A desqualificação social do magistério é notória e, infelizmente, tem marcas históricas em nosso país. Em Santa Catarina o magistério na Educação Básica é representado de forma significativa pelas mulheres que, embora enfrentem condições de trabalho aviltantes e planos de carreira mais aviltantes ainda, são responsáveis diretamente pela formação de crianças e jovens em diferentes etapas de aprendizagem. O que seria da escola e da educação sem as mulheres? Qual será o futuro das Licenciaturas em tal contexto, tendo em vista o crescente esvaziamento dos conteúdos escolares e da pouca procura dos/as jovens para atuarem na Educação Básica? Por que o magistério é um dos poucos exercícios profissionais em que jornalistas, economistas, etc., acreditam poder se intrometer, ainda que não tenham qualquer conhecimento de causa sobre os desafios da organização do trabalho pedagógico e sobre as principais linhas teóricas e metodológicas da Educação?
Talvez nos encontremos muito próximos de um ensino apostilado em larga escala, em que a atuação do professor será cada vez mais pragmática e pouco propositiva. As consequências de uma escolarização aligeirada ou ‘por demanda’, atinge via de regra os filhos da classe trabalhadora, que terão uma diplomação simplificada para trabalhos supersimplificados. Tal lógica perversa, e que perpetua todas as desigualdades escolares possíveis, espraia-se em nível mundial, o que não é só preocupante como aterrador.
Ao se desqualificar o trabalho de um professor, de uma professora, desqualifica-se a formação de crianças e jovens que participarão da vida pública. O processo civilizatório assumido pela escola submerge-se em meio à falta de intencionalidade pedagógica e política, o que em outras palavras significa uma formação precária ou insuficiente. Se os professores forem reduzidos a meros instrutores pelas políticas públicas em vigor, teremos uma nação de analfabetos políticos, desconhecedores de sua própria história. Não por acaso, isto tem se revelado em nosso país por meio de divisionismos e maniqueísmos empobrecedores. Há um recuo da teoria, professores mal formados e inconsistência nas práticas pedagógicas em todos os níveis de ensino. Culpabilizar os professores e remetê-los à desqualificação é uma atitude cômoda por parte do Estado e, especialmente, por determinados matizes político-partidários. Faz-se urgente a qualificação da Educação Básica e o aprofundamento dos conhecimentos produzidos pela humanidade, caso contrário, caminharemos definitivamente para a barbárie!




CERCO À IGNORÂNCIA HISTÓRICA



   Há um Brasil profundo que foi tematizado por diversos pesquisadores ou intérpretes de nosso país, destacando-se Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Júnior, Raymundo Faoro, Darcy Ribeiro e Gilberto Freyre, ainda que pese sobre tais tendências analíticas controvérsias e toda sorte de contradições teórico-metodológicas. Este Brasil profundo exige um debruçar-se sobre o processo colonizatório e as diversas contendas aí brotadas entre os povos originários, afrodescendentes e europeus que aqui se enraizaram e formaram esta nação tão complexa e também tão desigual.
   As manifestações recentes no Brasil são reflexos imediatos de uma crise ética, moral e civilizatória, onde o que impera é a desistoricização, o presentismo pragmático, preconceitos de classe e de gênero e uma pauta reivindicatória difusa, autoritária e longe de ser propositiva. Ao não se radicalizar, ou seja, ir à raiz das questões estruturais deste país, comete-se em nome da moralidade, propriedade e bons costumes um ideário proto-fascista de contornos ainda não totalmente claros. Evidencia-se, pois, que todos os esforços analíticos de uma geração de pensadores das mais diferentes áreas do conhecimento estão sendo totalmente desqualificados em nome de uma doutrinação militarizada e saudosista, a ponto de se vilipendiar educadores da estirpe de Paulo Freire (1921-1997).
   Entre o Brasil profundo e o Brasil epidérmico há inúmeros embates a serem travados agora e futuramente. Há um divisionismo de classe instaurado e isto exigirá dos movimentos sociais formas organizativas não reformistas, pois isto não aplaca as gritantes diferenças sociais e econômicas. Em nível mundial, 1% da população mundial detêm 50% do PIB do planeta; enquanto no Brasil, os 50% mais pobres detêm apenas 2% da riqueza produzida; já os 0,20% dos milionários brasileiros detêm mais de 40% de nossa riqueza. Ainda assim, as grandes fortunas não são e, pelo visto, nunca serão taxadas.
   A denominada ‘classe média’ que foi às ruas pedir o impeachment da presidente da República, aliançada e sintonizada ideologicamente com as elites econômicas, desconhece olimpicamente um dos ensinamentos de Paulo Freire, ou seja, de que o oprimido nunca deixará de ser oprimido quando continuar pensando com a cabeça do opressor. Por fim, é bom destacar que o Brasil atravessa hoje tal crise civilizatória, justamente, por não ter priorizado uma educação formal efetivamente qualificada a todos, promovendo sérias e epidêmicas desigualdades escolares que se traduzem na simplificação do conhecimento político e do que isto possa significar para as transformações de nossa sociedade.