segunda-feira, 23 de março de 2015

CERCO À IGNORÂNCIA HISTÓRICA



   Há um Brasil profundo que foi tematizado por diversos pesquisadores ou intérpretes de nosso país, destacando-se Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Júnior, Raymundo Faoro, Darcy Ribeiro e Gilberto Freyre, ainda que pese sobre tais tendências analíticas controvérsias e toda sorte de contradições teórico-metodológicas. Este Brasil profundo exige um debruçar-se sobre o processo colonizatório e as diversas contendas aí brotadas entre os povos originários, afrodescendentes e europeus que aqui se enraizaram e formaram esta nação tão complexa e também tão desigual.
   As manifestações recentes no Brasil são reflexos imediatos de uma crise ética, moral e civilizatória, onde o que impera é a desistoricização, o presentismo pragmático, preconceitos de classe e de gênero e uma pauta reivindicatória difusa, autoritária e longe de ser propositiva. Ao não se radicalizar, ou seja, ir à raiz das questões estruturais deste país, comete-se em nome da moralidade, propriedade e bons costumes um ideário proto-fascista de contornos ainda não totalmente claros. Evidencia-se, pois, que todos os esforços analíticos de uma geração de pensadores das mais diferentes áreas do conhecimento estão sendo totalmente desqualificados em nome de uma doutrinação militarizada e saudosista, a ponto de se vilipendiar educadores da estirpe de Paulo Freire (1921-1997).
   Entre o Brasil profundo e o Brasil epidérmico há inúmeros embates a serem travados agora e futuramente. Há um divisionismo de classe instaurado e isto exigirá dos movimentos sociais formas organizativas não reformistas, pois isto não aplaca as gritantes diferenças sociais e econômicas. Em nível mundial, 1% da população mundial detêm 50% do PIB do planeta; enquanto no Brasil, os 50% mais pobres detêm apenas 2% da riqueza produzida; já os 0,20% dos milionários brasileiros detêm mais de 40% de nossa riqueza. Ainda assim, as grandes fortunas não são e, pelo visto, nunca serão taxadas.
   A denominada ‘classe média’ que foi às ruas pedir o impeachment da presidente da República, aliançada e sintonizada ideologicamente com as elites econômicas, desconhece olimpicamente um dos ensinamentos de Paulo Freire, ou seja, de que o oprimido nunca deixará de ser oprimido quando continuar pensando com a cabeça do opressor. Por fim, é bom destacar que o Brasil atravessa hoje tal crise civilizatória, justamente, por não ter priorizado uma educação formal efetivamente qualificada a todos, promovendo sérias e epidêmicas desigualdades escolares que se traduzem na simplificação do conhecimento político e do que isto possa significar para as transformações de nossa sociedade.





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