domingo, 27 de janeiro de 2019

O GANGSTERISMO RELIGIOSO NO BRASIL


Como bem apontou a jornalista Andrea Dip em sua investigação sobre a ascensão das religiões neopentecostais no Brasil, o binômio política/religião se tornou uma mistura explosiva num país em que quem tem definido as regras do jogo político são as bancadas da Bíblia, do Agronegócio e das Armas no Congresso Nacional.

Mas não basta tomar o poder. “A direita orgulhosa, religiosa e conservadora homenageia torturadores em carros de som nas grandes avenidas”. Orgulham-se, portanto, de sua ignorância; polemizam e provocam especialmente partidários e simpatizantes da esquerda. Representam a maioria agora. Não têm medo de serem punidos. Estão do lado das ‘pessoas de bem’.

A Frente Parlamentar Evangélica (FPE) no Congresso Nacional é gigantesca, congregando diversos partidos, inclusive parlamentares de partidos de esquerda. A Comissão Pró-Política de Santa Catarina, estado que abraçou o capitão reformado do exército com uma expressiva votação em 2018, por seu turno, representa “um departamento da Convenção das Igrejas Evangélicas Assembleia de Deus de Santa Catarina e Sudoeste do Paraná, cuja missão é conscientizar os fiéis sobre a importância de votar em representantes dos interesses da Igreja (...). a comissão se orgulha de ter ajudado a eleger 110 vereadores, 5 prefeitos e 4 vice-prefeitos ligados a ela nos últimos pleitos”.

Os temas de cunho moral são os que unificam os parlamentares evangélicos, independentemente de partido. Como são avessos aos argumentos, às evidências, à ciência sistematizada, são “barulhentos, intempestivos, aguerridos, beligerantes, e esse barulho cria a impressão de volume, de quantidade de poder, de coesão. (...). é uma estratégia de parecer maior do que é, pelo grito – como acontece nas próprias igrejas. As Igrejas têm esse discurso de guerra, de combate”. Mas as alianças dos evangélicos com o capital também é evidente. Não por acaso a bancada BBB (Bíblia/Bala/Boi) vota em bloco em qualquer situação!

Até determinados pastores, acima de qualquer suspeita, denunciam de que as novas instituições neopentecostais estão repletas de gângsteres religiosos, afeitos à lavagem de dinheiro, sonegação de impostos e outras improbidades. Didaticamente, importante se dizer, de acordo com os estudos do sociólogo Paul Freston e trazido à baila por Andrea Dip, de “que a diferença mais importante entre as Igrejas Históricas e as Pentecostais é a crença nos dons do Espírito Santo”. As igrejas pentecostais estariam mais próximas da cultura do espetáculo e seriam menos litúrgicas; no que tange às igrejas neopentecostais, como a IURD, Renascer em Cristo, Bola de Neve, etc., as mesmas representam a “terceira onda do evangelismo”, com ênfase na guerra contra o diabo e seus representantes na Terra, além de difundirem a Teologia da Prosperidade e o abandono dos tradicionais usos e costumes puritanos da santidade, conforme análise do sociólogo, Ricardo Mariano. Em outras palavras, a Teologia da Prosperidade é uma reatualização dos estudos weberianos, conhecida por seus “apelos financeiros como forma de garantir um espaço no céu”. Neopentencostalismo e o espírito do capitalismo se convergem, nessa direção!

Tais igrejas detêm 1/3 das concessões de televisão no Brasil. Uma verdadeira farra de concessões sem qualquer regularização e a desejada e ampla discussão com a sociedade brasileira. Assim, foram angariando simpatizantes nas periferias, historicamente esquecidas pelo poder público, que segundo o filósofo e psicanalista, Guilherme Boulos, desencadeou uma verdadeira “captura subjetiva, mais do que a difusão de uma ideologia. Tem a ver também com o empreendedorismo e com o esvaziamento de soluções coletivas. O crescimento das Neopentecostais junto com o empreendedorismo e com o enfraquecimento dos movimentos sociais, produz esse caldo de uma ‘direitização’, mas isso não é simples, não dá para julgar o pensamento dos evangélicos pelo pensamento dos pastores e líderes das Igrejas”. Tanto é verdade que nem todo evangélico votou no capitão reformado do exército, embora os mais de 20 milhões de votos necessários à Haddad no segundo turno do certame eleitoral de 2018 estivessem concentrados nestes guetos neopentecostais espalhados por todo o país.

Tragicamente, os neopentecostais tornaram-se “personagens de um processo sem precedentes no país, com plataformas baseadas na retórica do terror (‘querem acabar com a família’), pelo impedimento da garantia de direitos sexuais e reprodutivos e das ações de superação da violência de gênero. O que se desenha, como vemos, pouco ou nada tem a ver com a defesa das famílias. Acaba por ser uma armadilha (instrumentalização) de grupos políticos para quem professa uma fé”. Há mais de 1.500 denominações evangélicas no Brasil. Para a pesquisadora Christina Vital o plano das lideranças dessas Igrejas é ocupar cargos executivos e o Judiciário, para barrar as pautas relacionadas aos direitos reprodutivos das mulheres e à comunidade LGBTQ.

Se a canalhice foi, efetivamente, santificada, de acordo com as palavras da jornalista Andrea Dip, que a mesma seja desvelada, desmascarada e totalmente destruída. Tal onda reacionária está aniquilando os parâmetros civilizatórios que esse país construiu a duras penas, mas que até hoje não pôde se consolidar pela intervenção das elites dirigentes e agora apoiada por estas máfias religiosas sedentas de poder e glória!