quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Alerta para Florianópolis



Jéferson Dantas[1]

As chuvas que abalaram a cidade do Rio de Janeiro nos últimos anos, ceifando a vida de centenas de pessoas, notadamente as que residem nas encostas dos morros, é uma demonstração evidente de que as políticas públicas nas grandes metrópoles foram incapazes de resolver problemas crônicos de ocupação irregular nos morros e, principalmente, em reduzir as elevadas taxas de migração. A cidade de Florianópolis, guardadas as devidas proporções, vivencia uma situação tão alarmante quanto à do Rio de Janeiro. Apenas em sua área insular no Maciço Central do ‘Morro da Cruz’, concentra-se aproximadamente uma população de 30 mil habitantes. A área total do Maciço é de 2,1 milhões de metros quadrados, sendo que quase 700 mil metros quadrados são de ocupação humana. Todavia, outros ‘bolsões de miséria’ tem se espalhado por outros bairros periféricos de Florianópolis em seu recorte insular e também continental, sem falar do elevado adensamento populacional nas cidades que circundam a capital catarinense.

Já na década de 1990, das 11 áreas de risco da ilha de Santa Catarina, 9 estavam concentradas no Maciço do Morro da Cruz, provavelmente ocasionadas pela extração de madeira, esgotamento do solo e construção de habitações irregulares. Num período de chuvas mais constantes, o perigo de deslizamento nas encostas dos morros sobe para quase 10%, segundo estudos dos geomorfólogos. Se o adensamento populacional nas comunidades dos morros do Maciço manter este ritmo nos próximos anos, provavelmente teremos um cenário trágico tão devastador quanto o que ocorreu no Rio de Janeiro e Niterói.

Compreender as desigualdades espaço-temporais e as dinâmicas de produção da existência nos espaços urbanos deveria estar no horizonte de qualquer planejamento estatal. Entretanto, numa cidade como Florianópolis onde os espaços públicos estão sendo cada vez mais privatizados e onde há um isolamento ‘sanitário’ entre os de ‘cima’ e os de ‘baixo’, as perspectivas não são nada animadoras. Tais territórios ‘guetizados’, muitas vezes sem acesso à água potável, sistema de esgoto, recolhimento do lixo doméstico, são formados por homens e mulheres estigmatizados por viverem nos morros (muitos/as deles/as provenientes das áreas rurais de Santa Catarina), ainda que boa parte Da força de trabalho da construção civil sobrevenha destes espaços sociais. Não há mais como fugir desta problemática, sob pena de, literalmente, chorarmos sob o leite derramado.






[1] Historiador e Doutorando em Educação (UFSC). Articulador, pesquisador e consultor pedagógico na Comissão de Educação do Fórum do Maciço do Morro da Cruz (CE/FMMC). E-mail: clioinsone@gmail.com.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

A OFENSIVA DOS HISTORIADORES



Jéferson Dantas[1]

A materialidade do ofício dos historiadores são as fontes (periódicos, revistas, relatórios, iconografias, atas, cartografias, etc.) e, a partir delas, a investigação sócio-histórica se adensa e se complexifica de acordo com as ferramentas metodológicas provenientes de sua episteme. No que tange ao conhecimento histórico escolarizado, a pesquisa acadêmica oferece importantes subsídios para os professores da Educação Básica repensarem as suas práticas pedagógicas ou mesmo adotarem livros didáticos sintonizados com a reflexão permanente e o gosto pela pesquisa.

Contudo, os historiadores – profissão ainda não reconhecida/regulamentada pelo Congresso Nacional – estão impossibilitados de exercerem o seu ofício, principalmente aqueles que lidam com a história recente do país. Documentos relacionados à tortura durante o período ditatorial no Brasil (1964-1985) encontram-se indisponíveis, justamente, para os/as profissionais que mais necessitam destas fontes para a condução de suas investigações científicas. Países como Argentina e Chile têm prestado contas do seu passado histórico recente, não apenas para trazer à tona as chagas da Ditadura, mas para que as novas gerações conheçam e lutem por uma sociedade desprovida da lógica persecutória e de atentados à vida e à dignidade humanas.

O ex-ministro da Defesa, Nelson Jobim, foi omisso ou incapaz de interceder junto às Forças Armadas a abertura dos documentos relacionados ao período ditatorial. Fica-nos a impressão de que não é importante remexer nas feridas do passado, protelando-se ou condenando ao esquecimento o que, efetivamente, não pode ser esquecido. Os historiadores lidam, essencialmente, com três categorias centrais: o tempo, o espaço e a memória. Na conjugação destas três categorias estrutura-se a ‘narrativa histórica’, delimitada temporalmente e dependente das fontes disponíveis. O Estado brasileiro, todavia, tem negado aos historiadores o direito da pesquisa, embora a Comissão de Direitos Humanos e Minorias no Congresso Nacional tenha aprovado a criação da Comissão Nacional da Verdade, que objetiva o esclarecimento da violação dos direitos humanos durante o regime militar.

A Lei da Anistia de 1979, uma excrescência jurídica que igualou torturadores e torturados, tentou apagar definitivamente qualquer possibilidade de dissenso. Entretanto, a História existe para continuarmos lembrando daquilo que insistentemente os variados veículos de manipulação insistem em menosprezar e destruir. Clio, portanto, manter-se-á insone e vigilante!


[1] Historiador e Doutorando em Educação (UFSC). Secretário-Geral da ANPUH (Associação Nacional dos Professores de História) Seção Santa Catarina. E-mail: clioinsone@gmail.com.

domingo, 7 de agosto de 2011

CONVITE: Espetáculo Musical 'Letras para composições invernais"

Amig@s!

Convidamos para o espetáculo "Letras para composições invernais" (Ensaio 1), com Jéferson Dantas (violão elétrico e voz) e Júnior Guerra (violão acústico).
ONDE: Teatro da Ubro
QUANDO: 27 de agosto de 2011 (sábado)
HORÁRIO: 20h
QUANTO: R$ 10,00 (Inteira) e R$ 5,00 (Meia-entrada)
INGRESSOS: à venda com os músicos ou diretamente na bilheteria do Teatro da Ubro (Escadaria da Rua Pedro Soares, 15, Centro, Florianópolis/SC).
RELEASE: O espetáculo apresenta um repertório de 23 canções, tendo como temáticas centrais: o amor, a amizade, a solidão e a paisagem sulista imortalizada nas milongas. O show é um 'ensaio' para o espetáculo futuro Milongas Urbanas concebido por Jéferson Dantas e o percussionista de origem uruguaia, Pablo Mizraji, tendo a participação especial do baixista, Gilberto Borges. Júnior Guerra se integra a este projeto com arranjos de cordas. Todos os músicos são integrantes do grupo poético-musical Casa da Ginga.
As letras das canções são de autoria de Danielle Antunes, Jéferson Dantas e Pablo Mizraji.

Influências musicais: Vitor Ramil, Secos & Molhados, Kleiton & Kledir, Leopoldo Rassier, César Passarinho e Victor Hugo.

Links (Projeto Milongas Urbanas)
                 http://youtu.be/6nVbc4EXIPU
                 http://youtu.be/p3iEQ1kyH2o

Palco MP3 Jéferson Dantas: http://palcomp3.com/jefdantas/#

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

EXEMPLO QUE VEM DO CHILE


 

O Chile foi o primeiro país da América Latina a implementar medidas neoliberais ainda na década de 1970 durante a ditadura de Augusto Pinochet (1915-2006), que por meio de um golpe de Estado governou aquele país de forma extremamente brutal de 1973 a 1990. Amigo pessoal de Margaret Thatcher – então primeira-ministra britânica entre 1979 e 1990 – e alcunhada de dama de ferro devido à sua postura política extremamente liberal e ao mesmo tempo autoritária e privatista, Pinochet conduziu o Estado chileno a uma dependência excessiva dos ‘humores’ do mercado. Áreas estratégicas como saúde e educação ficaram nas mãos da iniciativa privada e nos dias de hoje o Chile não chega a investir 2% de seu PIB em educação pública, o que tem gerado uma série de protestos pela juventude chilena, que tem dificuldades em obter o crédito educativo para se manter numa universidade.

Os efeitos do neoliberalismo se fizeram sentir num curto espaço de tempo. Se para a dama de ferro ‘não havia alternativa’ e a única saída era a salvaguarda do deus-mercado, a história nos mostra que a anulação da democracia e a tentativa de se destruir as identidades coletivas (sindicatos, movimentos sociais, fóruns, etc.) requer hoje em dia uma nova interpretação diante dos recentes acontecimentos que mobilizam as novas gerações sem perspectivas de empregabilidade. A ‘retórica do inevitável’ apregoada pelas políticas neoliberais ganhou com as manifestações estudantis no Chile um novo panorama em termos de aplicação dos recursos públicos pelo Estado. A bancarrota dos países ibéricos e da Grécia na Europa são também sintomas evidentes de como o capital especulativo e a ciranda financeira podem destruir os sonhos e as perspectivas das futuras gerações.

Mais do que ícones que possam surgir a partir das grandes manifestações estudantis no Chile, há aí uma demonstração muito vivaz de que é possível se construir ‘outras alternativas’ diante do fatalismo neoliberal. O presidente chileno Sebastián Piñera, que amarga apenas 30% de aprovação popular, terá de enfrentar a herança de Pinochet, o que não significa que fará grandes mudanças sociais já que representa os interesses da elite conservadora chilena. Por outro lado, o Chile é o ‘emergente grupal’ latino-americano – apenas para utilizar um termo psicanalítico – tendo em vista que suas mazelas denotam as rachaduras de um modelo econômico incapaz de comportar as demandas sociais. Há de se aprender com as lições chilenas!