As palavras de
Eduardo Hughes Galeano (1940-2015) continuarão ecoando em todos os cantos da
América Latina. O escritor e jornalista uruguaio, falecido no dia 13 de abril,
foi um dos mais notáveis cronistas de nosso tempo. Sem abrir mão da
contundência, deixou-nos um dos maiores clássicos sobre a violência colonial no
continente americano: As veias abertas da
América Latina. Esta obra foi lançada em 1971, período em que ditaduras
militares grassavam pela América do Sul, deixando suas deletérias marcas de
sangue, torturas, prisões arbitrárias e a infeliz certeza de que determinadas
permanências históricas, por meio do imperialismo estadunidense, impunham-nos formas
diversas e perversas de colonização.
Na década de 1980, a
trilogia Memórias do fogo,
arrebatava-nos pelo poder de síntese e pela maneira como os diálogos históricos
se entrecruzavam em diferentes épocas, sem perder o caráter de totalidade.
Afinal, Galeano, como notório esgrimista das palavras, sabia como ninguém
expressar a crueza das atrocidades humanas, mas igualmente a generosidade do
gênero humano, com exemplar e preciosa habilidade poética. Aficionado por
futebol, não se cansava de vangloriar a celeste uruguaia, que lhe deu imensa
alegria na copa do mundo de 2010.
Galeano foi
inspirador para as minhas escolhas profissionais. Queria ser jornalista, mas me
tornei historiador. Intencionava traçar novos horizontes no ensino da História
para os estudantes da Educação Básica, acalcanhado em narrativas que posicionassem
os povos latino-americanos como protagonistas de suas trajetórias e donos de
suas memórias. Eduardo Galeano nos ensinou isso durante mais de cinco décadas:
o respeito às nossas culturas ancestrais e a todos os trabalhadores que
esmigalharam suas vidas em troca da exploração incessante e sistemática de suas
forças de trabalho.
A impressão que fica
é de que Galeano não partiu. Nunca partirá. Está em algum lugar de Montevidéu observando
a turba da ciudad vieja, imaginando
novas histórias e influenciando novas gerações. Escritores da linhagem de
Galeano são cada vez mais raros, porque sempre atuaram na contracorrente. A
coerência da militância jornalística e o compromisso com os excluídos eram suas
principais ferramentas analíticas. O Uruguai perde um grande escritor,
reconhecido internacionalmente. Mas, sobretudo, a América Latina perde um ser
humano que diante da aridez da existência era capaz de adocicá-la com as
palavras ingênuas de um infante que pela primeira vez enxergou o mar. Galeano,
és imortal!