Os cientistas sociais
Pierre Dardot e Christian Laval na obra A
nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal realizam uma
importante investigação sobre o que denominam de ‘sujeitos de um novo tipo’,
mais afeitos à competitividade, ao risco e à busca da eficácia. Segundo os
autores, “o efeito procurado pelas novas práticas de fabricação e gestão do
novo sujeito é fazer com que o indivíduo trabalhe para a empresa como se
trabalhasse para si mesmo (governo de si empresarial)”, ou seja, a
racionalidade neoliberal estaria produzindo sujeitos preocupados com a
maximização de seus resultados, expondo-se a riscos e assumindo inteiramente a
responsabilidade por eventuais fracassos.
O discurso gerencial
ganha tal dimensão que este ‘novo sujeito’ é visto como proprietário de capital
humano, que ele precisa acumular por meio de um cálculo responsável entre
custos e benefícios. Em outras palavras, a distribuição dos recursos econômicos
e das posições sociais é vista exclusivamente como consequência de percursos
bem ou mal sucedidos, diferenciando os riscófilos
(os que têm gosto pelo risco e potenciais empreendedores) dos riscófobos (os que têm medo de arriscar,
mais afeitos aos ofícios tradicionais). Os ‘gestores do risco’ seriam mais
adaptáveis e suscetíveis à intensificação do desempenho. Não por acaso a figura
do coaching é tão difundida nos dias
de hoje, como apontam os cientistas sociais: “Foi esse modelo mais do que o
discurso econômico sobre a competitividade que permitiu naturalizar esse dever do bom desempenho e difundir nas massas
certa normatividade centrada na concorrência generalizada”.
Em síntese, a obra nos
faz refletir sobre o significado da neogestão,
calcada no controle dos comportamentos e atitudes dos trabalhadores, que diante
do enfraquecimento dos coletivos de trabalho, isolam-se e internalizam
fracassos. Tal discurso da ‘realização de si mesmo’ e de ‘sucesso na vida’ leva
a uma estigmatização dos ‘perdedores’, ‘perdidos’, isto é, dos incapazes de se
adaptarem à nova norma social de felicidade. O fracasso social é visto, em
última instância, como uma patologia. Concluem os autores que parece ser inútil
lamentar a crise das instituições (família, escola, organizações sindicais) e
tentar compreender como todas essas instituições são hoje incorporadas e
transformadas em dispositivos de desempenho/eficácia em nome da modernização. Ou ainda, “oscilando
entre depressão e perversão, o neosujeito é condenado a ser duplo: mestre em
desempenhos admiráveis e objeto descartável”.
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