Por uma estética subtrópica
O músico, compositor e
escritor gaúcho, Vitor Ramil (1962-), num opúsculo intitulado A estética do frio: conferência de Genebra,
publicado em 2004, procurou sintetizar as controversas influências literárias e
musicais do Rio Grande do Sul e dos países do Prata (Argentina e Uruguai),
assim como as lutas identitárias neste país continental. Ramil utiliza o
emblema do “frio” para catapultar o gênero musical milonga, expressão de origem africana, plural de mulonga e que significa “palavra”. A
milonga-canção é conhecida pelos seus acordes menores, lenta, repetitiva e
“afeita à melancolia, à densidade, à reflexão apropriada tanto aos voos épicos
como aos líricos, tanto à tensão como à suavidade, e cuja espinha dorsal são o
violão e a voz”, segundo as próprias palavras do gaúcho de Satolep, anagrama de sua cidade natal, Pelotas. De certa forma,
isto revela a obra consolidada de Ramil, tanto a musical quanto a literária.
Indagado certa vez sobre como era ser um músico à margem do eixo Rio-São Paulo,
respondeu da seguinte maneira: “Não estamos à margem de um centro, mas no
centro de uma outra história”.
Não por acaso, o documentário A
linha fria do horizonte – lançado este ano e com direção do cineasta curitibano,
Luciano Coelho – procurou captar, justamente, a obra e o pensamento de um grupo
de compositores do sul do Brasil, Argentina e Uruguai que têm como consonância em
suas obras a paisagem e o sentimento do local onde vivem. O satolepense Vitor Ramil, os uruguaios
Daniel e Jorge Drexler e o argentino Kevin Johansen são alguns dos músicos que
por meio de suas criações, conjeturam sobre as questões identitárias local e
global transversalizadas pela “estética do frio”. A produção documental foi
realizada nos meses invernais de junho/julho de 2011 e 2012, totalizando mais
de 120 horas de filmagem.
Evidentemente,
que ao se buscar uma estética subtrópica em contraponto ao estereótipo solar do
Brasil tropical e carnavalesco, faz-se necessário pensar
uma produção cultural mais ampla da região sul do Brasil, onde se inscreve
Santa Catarina e o Paraná. E, ao se fazer isso, a alegoria metafórica da
paisagem não pode se circunscrever ao burlesco, ou seja, à descrição passiva da
paisagem como algo afastado de uma cultura histórica repleta de conflitos
regionais (revoltas farroupilha e federalista, o conflito do Contestado, etc.)
e que, por si só, notabilizam estes territórios em insídias políticas e
afirmação de novas fronteiras.
PARA SABER MAIS:
RAMIL, Vitor. A estética do frio: conferência de Genebra.
Porto Alegre: Satolep, 2004.
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