quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Por uma estética subtrópica



O músico, compositor e escritor gaúcho, Vitor Ramil (1962-), num opúsculo intitulado A estética do frio: conferência de Genebra, publicado em 2004, procurou sintetizar as controversas influências literárias e musicais do Rio Grande do Sul e dos países do Prata (Argentina e Uruguai), assim como as lutas identitárias neste país continental. Ramil utiliza o emblema do “frio” para catapultar o gênero musical milonga, expressão de origem africana, plural de mulonga e que significa “palavra”. A milonga-canção é conhecida pelos seus acordes menores, lenta, repetitiva e “afeita à melancolia, à densidade, à reflexão apropriada tanto aos voos épicos como aos líricos, tanto à tensão como à suavidade, e cuja espinha dorsal são o violão e a voz”, segundo as próprias palavras do gaúcho de Satolep, anagrama de sua cidade natal, Pelotas. De certa forma, isto revela a obra consolidada de Ramil, tanto a musical quanto a literária. Indagado certa vez sobre como era ser um músico à margem do eixo Rio-São Paulo, respondeu da seguinte maneira: “Não estamos à margem de um centro, mas no centro de uma outra história”.
Não por acaso, o documentário A linha fria do horizonte – lançado este ano e com direção do cineasta curitibano, Luciano Coelho – procurou captar, justamente, a obra e o pensamento de um grupo de compositores do sul do Brasil, Argentina e Uruguai que têm como consonância em suas obras a paisagem e o sentimento do local onde vivem. O satolepense Vitor Ramil, os uruguaios Daniel e Jorge Drexler e o argentino Kevin Johansen são alguns dos músicos que por meio de suas criações, conjeturam sobre as questões identitárias local e global transversalizadas pela “estética do frio”. A produção documental foi realizada nos meses invernais de junho/julho de 2011 e 2012, totalizando mais de 120 horas de filmagem.
Evidentemente, que ao se buscar uma estética subtrópica em contraponto ao estereótipo solar do Brasil tropical e carnavalesco, faz-se necessário pensar uma produção cultural mais ampla da região sul do Brasil, onde se inscreve Santa Catarina e o Paraná. E, ao se fazer isso, a alegoria metafórica da paisagem não pode se circunscrever ao burlesco, ou seja, à descrição passiva da paisagem como algo afastado de uma cultura histórica repleta de conflitos regionais (revoltas farroupilha e federalista, o conflito do Contestado, etc.) e que, por si só, notabilizam estes territórios em insídias políticas e afirmação de novas fronteiras.

PARA SABER MAIS:
RAMIL, Vitor. A estética do frio: conferência de Genebra. Porto Alegre: Satolep, 2004.
A LINHA FRIA DO HORIZONTE. Disponível em: http://www.linhafria.com.br/. Acesso em: 28 jul. 2014.





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