terça-feira, 15 de novembro de 2016

UM LONGO INVERNO

   Recentemente o cientista político André Singer, em artigo assinado para o jornal Folha de S. Paulo, argumentou que o país passará por um “longo inverno”, tendo em vista as recentes medidas de contenção de gastos públicos por parte do governo federal por 20 anos e que, concomitantemente, vêm acompanhadas de uma enorme desconfiança e contrariedade por parte da classe trabalhadora brasileira. Além disso, a suspeição institucional só tem crescido no Brasil, e o resultado das urnas no pleito municipal (com número expressivo de abstenções, votos brancos e nulos) é apenas um destes reflexos.
   
   A flexibilização das leis trabalhistas, políticas de ajuste estrutural e mudanças significativas no modelo de seguridade social, ocasionam toda sorte de incertezas em relação a uma vaga/posição no mundo do trabalho e, porque não dizer, advento de síndromes associadas ao pânico, ou mesmo quadros clínicos de depressão e ansiedade. Associado a isso, as situações de subempregabilidade têm levado ao aumento de suicídios e de doenças psicossociais em várias partes do mundo, não sendo incomuns os casos de morte por excesso de trabalho. Já a infotoxicação, resultado do uso significativo das redes sociais por parcela da população brasileira, nem sempre contribui para um debate aprofundado das questões conjunturais/estruturais que afetam o país. Tais fóruns virtuais além de se constituírem como vínculos frágeis de sociabilidade, alimentam a cizânia, a gramática do ódio e preconceitos de toda ordem, sem qualquer fundamentação histórica, que me parecem ser os dilemas destes tempos. A desrazão e o recuo da história e da política empobrecem as diferentes perspectivas analíticas, pois há simplificações reducionistas e binárias sobre as contradições sociais imperantes, especialmente, neste contexto de luta pela educação pública e pela manutenção de direitos trabalhistas adquiridos.


   De fato, um longo inverno se inscreve no Brasil e não há como alimentarmos uma falsa esperança com as medidas tomadas por este governo, que desde o afastamento da presidente Dilma Rousseff sofre com ausência de credibilidade e aprovação pública. Por outro lado, os agentes das mudanças históricas – e aqui me refiro, em especial, à juventude escolarizada e à classe trabalhadora – não sairão dos gabinetes presidenciais ou dos conluios jurídicos, mas dos setores que mais sofrem e sofrerão com a diminuição dos investimentos sociais. 

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