terça-feira, 26 de abril de 2011

A EDUCAÇÃO BRASILEIRA SOB A ÓTICA DE VEJA

A matéria intitulada “Você sabe o que estão ensinando a ele?” assinada pelas articulistas Monica Weinberg e Camila Pereira no semanário Veja (edição 2074 de 20 de agosto de 2008) é mais uma afronta à inteligência dos/as educadores/as brasileiros/as. Trata-se de uma pesquisa encomendada por Veja ao Instituto CNT/Sensus sobre o panorama educacional do país, tanto na rede educacional pública como na rede privada. Ao todo, segundo a reportagem, foram entrevistadas 3000 pessoas de 24 estados brasileiros, entre pais, estudantes e educadores. 

Surgida em 1968 sob a égide do regime militar no Brasil (1964-1985), o semanário do Grupo Abril tem se superado a cada edição no que se refere à ausência de ética e a um desmedido processo de desqualificação de renomados pensadores nacionais. A última vítima foi Paulo Freire. Escrevem as articulistas: “Muitos professores brasileiros se encantam com personagens que em classe mereceriam um tratamento mais crítico, como o guerrilheiro argentino Che Guevara, que na pesquisa aparece com 86% de citações positivas, 14% de neutras e zero, nenhum ponto negativo. Ou idolatram personagens arcaicos sem contribuição efetiva à civilização ocidental, como o educador Paulo Freire, autor de um método de doutrinação esquerdista disfarçado de alfabetização”. Imagino que a esta altura o Instituto Paulo Freire deve estar indignado com uma declaração tão leviana e infame. 

Mas, não é só. Veja mostra-se preocupada com a excessiva “ideologização” dos currículos e ao “desprezo” à lógica do capital ensinada pelos/as educadores/as. Desta forma, aventuram-se na avaliação de livros didáticos de História e Geografia, expondo a visão deturpada de seus autores, quase todos presos às utopias ultrapassadas do século XIX ou às teorias do próprio Marx. Repreendem os autores dos livros didáticos com uma legitimidade surpreendente ao afirmarem, categoricamente, que os regimes neoliberais melhoraram, sobremaneira, a vida dos brasileiros e que a venda de estatais aos grupos econômicos estrangeiros tornou a nossa economia mais dinâmica, além de fortalecer o poder aquisitivo da classe média. 

Nenhum/a pedagogo/a foi entrevistado/a na reportagem. Dois educadores foram expostos de forma leviana em relação às suas práticas pedagógicas em duas escolas particulares (melhor seria dizer que foram ridicularizados). E, por fim, convocam pais preocupados com a formação educativa de seus filhos a enfrentarem a “esquerdização caduca” do processo ensino-aprendizagem, que fatalmente não leva a lugar algum. 

Ora, o campo educacional é um campo de litígio. Sendo assim, evidente que há uma luta ideológica na composição de currículos e na formação do/as educadores/as. Veja há algum tempo tem evidenciado sua opção política e ideológica de forma irresponsável e inconsistente. Opta por uma estratégia desqualificatória a-histórica, desprovida de compreensão do movimento dialético que engendrou a pesquisa e o ensino no Brasil. Veja confunde crítica responsável a um amontoado de opiniões eivadas de senso comum. O pouco cuidado com a relevância do tema, infelizmente, em nada contribui para a ampliação do debate educacional que, evidente, faz-se necessário. A preocupação de Veja tem endereço certo: esmagar definitivamente o dissenso no campo educacional e promover a acolhida ao deus-mercado como última instância de um mundo agora, hegemonicamente, capitalista. Em outras palavras: silenciem os inadaptados! Silenciem os recalcitrantes das causas carcomidas pela “evidência dos fatos”. Veja, o semanário fascista do momento!
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2 comentários:

Danielle Antunes disse...

Infelizmente temos muitos pais de alunos leitores de Veja, que conjuntamente com tais tipos de veículos formadores de opinião, trabalham para depreciar e desqualificar os professores.. Professores não são mais formadores de seres humanos, são meros técnicos que preparam pessoas para entrar no mercado, este sim o caminho, a verdade e a vida.. e então não há como querer melhor qualidade na educação dos brasileiros, talvez sim, melhor qualidade na mão de obra...

fasdfasfas disse...

Acho que a veja tem todo o direito de criticar os livros didáticos, os professores, a ausência de uma construção sistematizada e criteriosa dos currículos nas escolas, e o próprio Paulo Freire (cuja base teórica, da qual me identifico, tem grandes lacunas e vem servindo como justificativa para impor uma “certa ditadura da inclusão nas escolas”)... O que realmente me angustia na reportagem é a tendência dela em querer censurar livros didáticos e até o currículo das escolas... Gerando um clima policialesco de patrulhamento e perseguição ideológica (como numa caça aos comunistas ateus comedores de criancinhas)... A reportagem estimula a perseguição. Como se a revista veja fosse dotadas da pedra filosofal!
Só tenho uma coisa a dizer aos entusiastas dessas tendências fascistas: Bem vindo a terceira margem do rio!!! K
Parabéns pela postagem... alias: muito bem escrita...