terça-feira, 6 de junho de 2006

PEDAGOGIA WALDORF



Diário da Tarde, 06/06/2006 - Belo Horizonte MG

à esquerda, Rudolf Steiner






Felizes na escola

por Helena Trevisan


Nossa filha mais velha já morava em Barcelona há um ano quando fomos visitá-la com seus dois irmãos. Na ocasião, o caçula tinha seis anos de idade e ainda não estava alfabetizado. Esse detalhe é muito importante para o que eu vou contar em seguida, pois se tornou o motivo pelo qual acabei escrevendo um livro tempos depois. Aconteceu que em Barcelona fomos visitar a Casa Juan Miró, um acervo das obras do grande pintor catalão. Uma das salas do museu intitulava-se Constelación. Ali, nos sentamos diante de uma tela por alguns instantes. E então, meio provocativa, perguntei ao pequeno: Victor, o que você está vendo? Uma constelação , respondeu ele, candidamente, para o meu mais total espanto.

Se tivessem feito essa pergunta a mim, com toda a minha capacidade intelectual devidamente amadurecida, essa resposta seria mais do que esperada. Além do fato, é claro, de eu ter lido a palavra constelación escrita no pórtico de entrada da sala. Mas, em se tratando de uma criança não alfabetizada, o que isso revelaria? Anos depois, a lembrança desse fato me trouxe uma súbita clareza no entendimento do que preconiza a pedagogia Waldorf,metodologia empregada na escola em que o Victor estuda até hoje. Criada em plena desolação do pós-guerra, em 1919, em Stuttgard, Alemanha, por um visionário chamado Rudof Steiner, a pedagogia foi aplicada pela primeira vez numa escola fundada para os filhos dos empregados da fábrica de cigarros Waldorf-Astória, daí o seu nome. A pedagogia leva em conta temas tão atuais, como preservação do meio ambiente, justiça social, formação ética, inteligência emocional, que é fácil esquecer que ela já tem quase um século de existência.

Na prática, ela prega que a transmissão do conhecimento deve acompanhar numa obediência rigorosa e solene, o desenvolvimento do aluno. Isso quer dizer que se deve respeitar o momento certo para se ensinar determinado conteúdo, e esse momento é quando o aluno experimenta no seu íntimo uma experiência semelhante. A prova do vestibular que assombra nossos jovens cada vez mais precocemente, cai como uma bomba em plena flor da idade, aquela etapa da vida em que tudo é só promessa, e quase nada realização, pois estamos tratando de futuro. São raros os casos em que, aos 17 ou 18 anos, umacriatura possa garantir que a carreira escolhida será de fato aquela para todo o sempre, pelo simples motivo de que não houve ainda existência suficiente para tamanha certeza. Podemos dizer que uma escola Waldorf não prepara os jovens para o vestibular. Prepara para a vida, da qual o vestibular é apenas uma parte e um treino, basta se dedicar a esse fim específico e tudo se resolverá, com maior ou menor brilho.

Quando nosso filho foi capaz de captar o que Miró expressou em pinceladas, compreendi que, mesmo sem conhecer letras, sem saber fazer contas, ele entendeu. E seu entendimento foi muito mais espontâneo e verdadeiro do que o meu, sua mãe letrada e com diploma universitário. A pedagogia Waldorf se propõe a formar homens livres. Isso dá sem subterfúgios ao se expressar pela arte, através das emoções. O que se aprende com a alma, jamais sai da cabeça e se manifesta nos gestos naturalmente. Se todas as metodologias de ensino se propusessem a ouvir o que os alunos dizem sem palavras, haveria mais estudantes felizes nas escolas.

Um comentário:

Anônimo disse...

Jéferson, prazer!

Adorei o texto e assino embaixo. Pena que aqui em Joinville ainda não temos nenhuma escola que utilize esta pedagogia, ou se tem, eu desconheço.

Abraço.
Carla
carlasimas@gmail.com