quarta-feira, 17 de maio de 2006

Cursinhos pré-vestibular esvaziados




Por Bruno Aires

Vestibular já foi sinônimo de sala lotada em cursos pré-vestibulares. Era uma época em que passar para uma universidade pública poderia significar o maior orgulho que uma família teria. Quem não passasse estava condenado a mais um ano de cursinho ou tentado a desistir do sonho do ensino superior. Apesar da procura pelas universidades públicas ainda ser grande, esta realidade mudou. As salas dos pré-vestibulares não estão mais tão cheias. E a universidade pública não é vista mais como a única alternativa de bons estudos. "O número de alunos dos cursos pré-vestibulares, hoje, é bem menor do que há dez anos. A expansão das universidades particulares fez com que, efetivamente, o interesse do estudante que conclui o ensino médio em fazer um curso preparatório tenha diminuído", avalia o diretor da rede MV1 de Ensino, professor José Carlos Portugal. Crise nas públicas tem seus reflexos - Uma das razões para que a procura pelos cursinhos tenha sido reduzida, segundo o professor Portugal, é o estado atual de muitas instituições públicas. "Um percentual de estudantes, não muito grande, está desiludido com o ensino público gratuito, pois não enxerga na universidade pública um caminho para a empregabilidade. Eles acabam buscando, equivocadamente, outras alternativas, comprometendo sua renda e sua escolaridade", lamenta.
Para o professor José Carlos Portugal, as constantes greves nas universidades públicas também contribuem para aumentar a desilusão pelo ensino superior público. "As greves, mesmo sendo justas, trazem um prejuízo para a formação dos alunos. O estudante não é bobo e, por isso, resolve buscar opções que vão lhe proporcionar melhores resultados no futuro. Neste sentido, a universidade pública está cada vez mais enfraquecida", afirma. Menos interesse pelas instituições públicas, menos interesse pelos cursos preparatórios. "A saída para os cursinhos é se adaptar, como fizeram as fábricas de discos e de videocassetas quando foram lançados os CDs e DVDs. Hoje, o mercado deve buscar um nicho específico e não mais ser um segmento de massa. Não há mais demandas reprimidas como antes", ressalta Portugal. (In)segurança é fator predominante.
De acordo com o professor Rui Alves, diretor pedagógico do Colégio/Curso pH, o que determina se o curso se mantém bem no mercado é a qualidade de ensino que oferece. Para ele, muitos estudantes ainda sonham com a universidade pública, mas o que acontece atualmente é que eles não têm mais o receio de optar por uma instituição particular. "Alguns estudantes, por exemplo, podem escolher tranqüilamente fazer Direito na UFRJ ou na PUC-Rio e optam pela segunda. Neste ponto, o que conta é a segurança. Muitos pais ficam preocupados dos filhos saírem à noite do Fundão, temendo a violência", destaca. O professor acredita ainda que as mudanças pelas quais os vestibulares vêm passando nos últimos anos contribuíram para que a realidade dos cursinhos também tenha mudado. "O vestibular mudou para melhor. Hoje, não há mais a ´decoreba´. As universidades querem fazer o aluno pensar cada vez mais. O melhor exemplo é a UFRJ, que faz um concurso totalmente discursivo. Isso contribui para mudar a situação dos cursinhos", analisa Rui Alves.

Mudanças começaram na década de 90

O professor George Cardoso, diretor pedagógico do Centro Educacional da Lagoa (CEL), concorda que as mudanças nos processos seletivos também foram responsáveis pela atual situação dos cursos pré-vestibulares. "Houve épocas em que as turmas dos cursinhos eram muito grandes. O professor tinha que lecionar no microfone. Hoje, os cursos trabalham com turmas menores. O vestibular atualmente cobra mais interpretação. Para você preparar o aluno para este tipo de concurso, é preciso um atendimento mais individualizado, impossível com o tamanho de turma que existia antes", explica. Para George Cardoso, os cursos pré-vestibulares estão em mudança desde o início da década de 1990, quando foram criadas escolas a partir de cursos preparatórios bem-sucedidos. "Nenhuma rede de ensino se mantém hoje só com o cursinho, que se tornou um apêndice financeiro. É a escola que permite que a rede continue. Por isso, todas as redes de cursos preparatórios, hoje, contam com escolas também. Aliás, apostar nessas duas vertentes é uma das características das melhores instituições de ensino", acredita.
As constantes greves no ensino público, mais uma vez, são apontadas como uma das razões para que as universidades particulares tenham atraído tantos estudantes. "Há mais de 10 anos que não se vê uma greve no ensino particular no Rio. Já no ensino público, há greve todo ano. Isso afasta alguns alunos, que optam por universidades particulares. Hoje, o ensino privado conta com instituições de muita qualidade e com bons recursos. O aluno quer estudar na UFRJ e na Uerj, mas também avalia se vale a pena ir para uma instituição particular. No mercado de trabalho, atualmente, o que conta mais é a competência e não o lugar em que o profissional se formou", diz George Cardoso. Para o diretor do Instituto Guanabara e do curso Miguel Couto, professor Victor Notrica, apesar de muitos estudantes pensarem na opção de uma universidade particular, o foco da maioria continua sendo a instituição pública, principalmente em algumas carreiras. "Nos cursos mais tradicionais, como Medicina e Direito, os estudantes querem passar para uma universidade pública ou, no máximo, para a PUC. Há uma qualidade reconhecida e um prestígio nestas instituições. Mas também há um percentual de alunos que, por optarem por outras carreiras, não tem este foco", afirma Notrica. Expansão das vagas e maior incentivo - O presidente da Fundação Cesgranrio e da Academia Brasileira de Educação (ABE), Carlos Alberto Serpa de Oliveira, lembra que outro aspecto vem aumentando o interesse pelas universidades particulares: o Programa Universidade para Todos (ProUni), do governo federal. "No Brasil, temos universidades de dois tipos, independentemente de ser pública ou privada. As boas universidades particulares são cada vez mais procuradas, principalmente porque elas
investem bastante em pesquisa e melhorias constantes", afirma.
Segundo o presidente da Cesgranrio, houve uma mudança fundamental nesta questão: o vestibular deixou de ser uma comoção. "Antes, faltavam vagas no ensino superior. Hoje, a realidade mudou bastante. Há muito mais oferta de vagas do que procura. E não só as universidades particulares estão se expandido. Algumas instituições públicas estão se interiorizando, abrindo novas unidades, e o governo também investe em abrir novas universidades", analisa. O professor Serpa, porém, revela que esta situação o deixa apreensivo. "Não se improvisam qualidade de ensino e um bom corpo docente de um dia para o outro. Uma mesma universidade não pode oferecer cursos de qualidades diferentes. Fico apreensivo de ver que algumas instituições públicas estão passando por situações difíceis para se manter e, mesmo assim, novas universidades públicas são criadas", avalia.
De acordo com Carlos Alberto Serpa, o fato de ser uma universidade pública não lhe dá o status de boa instituição de ensino. "Algumas universidades foram criadas há pouco tempo ou estão sem receber os investimentos necessários. Por isso, é importante que o governo faça periodicamente avaliações das instituições. É isso que vai indicar aos alunos e às famílias sobre a qualidade e o futuro dos cursos, garantindo uma escolha mais segura e consciente", orienta.

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