quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

O LEGADO PAPAL



O vetusto estado do Vaticano, com suas ideias e práticas medievais, sinaliza o quanto esta instituição está apartada de um mundo em colapso social, fruto de uma sociedade tangida por diferentes classes. No silêncio acolhedor e suntuoso da basílica de São Pedro, ecoam episódios da história que não podem ser esquecidos, embora durante séculos a igreja conservadora tenha se utilizado da força, da tortura e do preconceito para dizimar inimigos e detratores. Não podemos esquecer ainda da conivência da igreja católica com o ditador fascista Benito Mussolini durante a segunda guerra mundial (1939-1945), que por meio do Tratado de Latrão (1929), formalizou a existência do estado do Vaticano, um estado neutro politicamente e sob a autoridade do papa. Tal cumplicidade se estendeu ao apoio explícito ao nazifascismo e, mesmo Joseph Ratzinger, pertenceu às hostes da juventude hitlerista.

Durante mais de oito séculos a igreja católica comandou uma verdadeira caçada aos intelectuais laicos e às mulheres ditas ‘diferentes’, ou seja, que não se enquadravam em seus preceitos ignorantes e revanchistas. Muitos e muitas, literalmente, arderam nas fogueiras da Inquisição, sob a égide do ‘poder temporal’ dos papas. Na América Latina da segunda metade do século XX, a teologia da libertação procurou repensar a missão sacerdotal da igreja, em defesa dos oprimidos da terra e da cidade, e se defrontou com as críticas ferozes da cúria romana. Tal embate dividiu ainda mais suas hierarquias, e este divisionismo se fez sentir na perda galopante de fiéis e de sua autoridade espiritual.

É esta mesma igreja que condena as pesquisas em células-troco para salvar vidas e o uso de contraceptivos nos países miseráveis da África, além de ser declaradamente homofóbica. Nos termos do sociólogo Florestan Fernandes (1920-1995), o ‘preconceito retroativo’ permanece transversalizando o pensamento conservador da igreja católica, e isto significa dizer que esta instituição deste a Contrarreforma no século XVI, esteve do lado das forças políticas opressoras e escravistas. Logo, ao se tratar da renúncia de um papa, temos de remontar a trajetória histórica desta instituição religiosa, o que denota uma análise fincada em fontes, evidências e registros memorialísticos/orais, constituindo, efetivamente, um quadro consistente de seu legado, sem anacronismos.

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