sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Por que Chávez incomoda?




Por Jéferson Dantas


Hugo Chávez, presidente da Venezuela, tem ganhado a cena internacional com seus arroubos. Na reunião da cúpula ibero-americana ocorrida recentemente no Chile, foi ofendido com um sonoro ‘cala-boca’ pelo até então fleumático monarca da Espanha, Juan Carlos. Os adjetivos relativos à Chávez são inúmeros: ‘projeto de ditador’; ‘prepotente’; ‘arrogante’; ‘populista terceiro-mundista’; ‘bufão’; ‘caudilho’, etc.. Ainda que pese sobre o presidente venezuelano todos os adjetivos pensáveis e impensáveis, não há como negar as questões de fundo histórico suscitadas pelo mesmo, principalmente às que se referem à espoliação e/ou exploração das grandes potências européias no continente americano ao longo de séculos. É muito confortável que determinados congressistas brasileiros, ex-colaboracionistas da ditadura militar e, atualmente abrigados sob a égide da democracia, critiquem Chávez. Afinal, sua liderança pressupõe um ataque franco ao imperialismo estadunidense, algo que só Fidel Castro em Cuba era capaz de sustentar politicamente.



Não é o caso aqui de defendermos a política externa de Chávez ou de julgarmos seu comportamento numa perspectiva maniqueísta infantil. Se George Bush foi capaz de passar por cima da ONU e assassinar milhares de iraquianos e afegãos em ‘nome da democracia’ e gastar bilhões de dólares com armamentos, por que tal julgamento recairia apenas no ‘populista’ Chávez? A tão saudável democracia liberal defendida pelas lideranças latino-americanas não tem resolvido a contento o fosso entre os miseráveis e opulentos. A violência estrutural grassa o território latino-americano, num misto de desencanto e indignação social desarticulada. As questões ideológicas foram cinicamente incineradas e o desprezo à coisa pública arremessa cada vez mais os poderes republicanos constituídos na lama. Não por acaso, os mass media exploram com requintes de perversidade o ‘espetáculo da tragédia’. De um mundo mutilado pela desrazão, faz-se a manchete do dia seguinte. E Chávez é um prato cheio.



Vivemos um período histórico tão esquizofrênico, que até mesmo uma ofensa entre representantes de Estado, torna-se mercantilizável. E é, justamente, nesta sociedade de consumo, autofágica, neurótica e impotente coletivamente, que os/as representantes do povo articulam seus projetos individuais e a permanência parasita na cena política. Não precisamos que nos digam quem são os opressores e os oprimidos além de nossas cercanias. Tal desafio requer um posicionamento político coletivo capaz de discernir as opções de classe e os/as que defendem o status quo vigente; acima de tudo, exige compreensão histórica das lutas sociais, que continuam promovendo os dissensos e as denúncias de injustiça, para que, enfim, anuncie-se a igualdade entre os humanos.

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