domingo, 3 de junho de 2007

É possível transgredir nos limites da lei?




Por Jéferson Dantas


Em sua última edição a revista Isto É trouxe uma entrevista com o deputado federal Fernando Gabeira (PV/RJ), tendo como eixo temático as manifestações estudantis em São Paulo e a invasão da hidrelétrica de Tucuruí, no estado do Pará. Em tom ameno e bastante pragmático, Gabeira (ex-guerrilheiro durante o período da ditadura militar) defende o Estado de Direito e a resolução de tais impasses em fórum jurídico. Em outras palavras, o deputado reconhece a soberania da lógica do capital e a ausência de autoridade do Estado para a resolução das lutas corporativistas. Nas entrelinhas, há uma compreensão explícita de que os modelos de embate promovidos pelos sindicatos e movimentos sociais no Brasil caminham em descompasso com um país liberal e democrático.

Desse modo, pensar no Estado de Direito num país como o Brasil é um enorme quebra-cabeças. O aparato jurídico além de moroso precisaria ser refundado com os demais poderes. Ainda que Gabeira tenha renegado em parte seu passado e a construção do socialismo, países como o Brasil ainda são bastante influenciados pelo passado colonial, sendo o Congresso nacional o palco privilegiado do clientelismo e da corrupção endêmica. Como legalista, Gabeira se esquece de que mudanças sociais profundas só podem acontecer no litígio entre a sociedade civil e a sociedade política. As relações de poder são extremamente desiguais no Brasil. Soma-se a isso a despolitização de grande parcela da população, descrente em seus representantes e tomada de um ceticismo perigoso.

Assim, há duas ações que trafegam em desnível: a transgressão e a obediência às leis. E deve-se entender, antes de tudo, que transgredir no Brasil não é simplesmente ‘desobedecer as leis instituídas’. Ela se refere a uma mobilização social constante, que inclusive revela os limites do aparato jurídico burguês ou as suas contradições. Desobediência civil nem sempre significa ‘baderna’, ‘arruaça’. É um sintoma relevante de uma nação ainda em construção, que não consolidou o ‘Estado democrático de direito’ e que está longe de solucionar suas mazelas sociais.

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