O
educador pernambucano Paulo Reglus Neves Freire (1921-1997), deixou-nos uma
valiosa herança no campo educacional, especialmente por meio de uma obra que
completa 46 anos: Pedagogia do Oprimido
(1970). Freire iniciou a sua trajetória como educador em Recife, onde lecionava
Língua Portuguesa, vindo a dirigir o setor de Educação e Cultura do Serviço
Social da Indústria (SESI) entre os anos de 1947 e 1957. Devido à sua
proximidade com a ala progressista da Igreja Católica, muitas vezes foi acusado
pelos seus detratores de ser um conservador, pois seria inviável do ponto de
vista epistemológico a vinculação marxista com a dimensão cristã.
Filho de
um sargento do exército, Freire conheceu de perto a miséria e a fome, quando
com oito anos de idade teve de se mudar de Recife para a cidade pernambucana de
Jaboatão, devido à crise econômica de 1929. Aos treze anos perdeu o seu pai e
iniciou tardiamente os seus estudos no antigo ginasial. A sua formação
religiosa é tributária de sua mãe, onde militou no movimento de Ação Católica,
passando a ser um ferrenho crítico da ‘Igreja dos opressores’ e defensor da
‘Igreja dos oprimidos’.
Freire
analisava por meio do universo relacional dos oprimidos, que o compromisso
social não poderia vir de uma elite dirigente ou de um mero mecanismo
arbitrário jurídico. Por isso, toda e qualquer ação só se tornaria consciente e
participativa, quando os excluídos sociais fossem capazes de compreender a sua
trajetória histórica e a construção de suas identidades. Em outras palavras, de
nada valeria saber ler e escrever se a realidade dos oprimidos permanecesse
inalterada. Em 1979, com o seu retorno do exílio, Paulo Freire passa a discutir
de forma mais sistemática os efeitos da exploração colonial na América Latina,
o que lhe situa, atualmente, como um dos precursores da chamada pedagogia pós-colonialista,
influenciando os estudos sobre as teorias do currículo escolar.
Outro
aspecto conexo à reflexão de Freire é o adaptar-se
diante da aceleração tecnológica. Tais adaptações estruturais no mundo do
trabalho exigiriam homens e mulheres diferenciados, polivalentes,
multitarefeiros, sob pena de serem excluídos ou descartados pela lógica do
capital. Freire, todavia, vaticina: “Quanto mais o homem [e a mulher] é rebelde
e indócil, tanto mais é criador, apesar de em nossa sociedade se dizer que o
rebelde é um ser inadaptado”.
Paulo
Freire considerava que o/a educador/a disposto a criar vínculo com os seus
estudantes, precisaria compreender a sua prática social, rompendo com a
‘consciência ingênua’ para, finalmente, galgar a ‘consciência crítica’. Assim,
na consciência ingênua há uma busca de compromisso; na consciência crítica há o
compromisso; e numa consciência fanática, uma entrega irracional. Não caberia
ao/à educador/a ser um depositário de conteúdos (educação bancária), mas um sujeito comprometido com a sua prática
pedagógica. Sendo o/a educador/a um sujeito histórico, ele/ela é um agente de
mudança da estrutura social.
O legado
pedagógico de Freire é inegável, influenciando gerações de professores e
estudantes, e assinalando que o território educativo é prenhe de lutas e
embates permanentes. Contudo, a simplificação de sua obra ou a mera referência
ao seu legado, ainda são insuficientes para que se conheça, de fato, as suas
contribuições no mundo acadêmico e na Educação Básica.
PARA SABER MAIS:
FREIRE, Paulo. Pedagogia
do Oprimido. 14 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
FREIRE, Paulo. Educação
como prática de liberdade. 4 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974.