Pelé e Maradona: dois mitos da bola inquestionáveis. Pelé teve como a sua copa do mundo inesquecível o palco do México em 1970; Maradona, por seu turno, teve o mesmo palco do México para o brilho e o talento do seu futebol em 1986. As comparações e/ou semelhanças vão ficando por aí. Maradona volta e meia provoca Pelé e a imprensa argentina não se cansa de dizer que Maradona foi o melhor jogador do mundo de todos os tempos. São dois temperamentos distintos. O Maradona bufônico e intenso contrasta com o Pelé pragmático (quase fleumático) e empresário.
Suas histórias de vida também são distintas, mas vamos nos deter em suas personalidades. Maradona gosta de ver a sua imagem vinculada a outro mito argentino: Ernesto Che Guevara (1928-1967). Foi se tratar em Cuba devido a um processo de dependência química que quase abreviou a sua existência. Faz questão de chamar a atenção para si, e o seu personalismo ou a sua personagem desponta para ações que vão do excessivo afeto ou para a fúria destemperada. Já Pelé procura vincular a sua imagem ao filantropo, preocupado com as crianças pobres e sem escolaridade do Brasil. Sem qualquer vínculo político-ideológico consistente, Pelé é a personagem bondosa e caridosa, que no arquétipo de mito parece estar acima do bem e do mal. E nisso os dois se assemelham.
No brilhante livro do jornalista uruguaio Eduardo Galeano, Memórias do Fogo, o articulista relata a trajetória de Pelé e Garrincha, dois gênios da bola, mas também suas trajetórias distintas (Garrincha morreu na miséria). Pelé, literalmente, soube capitalizar seu nome a uma ‘marca’ conhecida nos quatro cantos do planeta. Ao se preocupar excessivamente com a sua personagem, não se deu conta de que um de seus filhos estava envolvido com consumo de drogas. A ficção e a realidade agora se confundiam.
A pretensa desavença destes dois ídolos do futebol alimenta a imprensa carnívora e temperou um pouco o mundial na África do Sul. No que se refere aos limites da coordenação técnica de Brasil e Argentina, Maradona representou a comédia e o drama, talvez calculadamente arquitetada; já Dunga, parecia ter saído dos porões da ditadura no melhor estilo ‘ame-me ou deixe-me’, liderando um escrete disciplinado, religioso e pouco dado à criação.